sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

Recolhimento para receber o Menino-Deus




Por Autor anônimo

Sempre que Deus quer fazer qualquer coisa de grande, sempre que quer pôr os alicerces de uma vida nova, prepara um lugar secreto, um abrigo de pureza e de silêncio, onde a sua ação possa ser recebida integralmente e sem que nada a perturbe.

Tudo começa no recolhimento e no mistério. Assim o vemos em Belém. Não é no tumulto da cidade nem na praça pública que Jesus vai nascer. Se procurarmos o lugar que Deus escolheu para vir ao mundo, encontraremos um estábulo, um esconderijo cavado na pedra. E, no fundo deste, veremos uma virgem, a mais pudica, a mais silenciosa, a mais discreta das criaturas. O coração desta virgem, onde não penetrou nenhum desejo mundano, foi o lugar que Deus escolheu para encarnar-se.

Pois bem, cada um de nós deve estar em condições análogas para receber a vida da graça e assegurar o seu desenvolvimento até que o próprio Cristo viva em nós. A nossa vida corrente deve ser um refúgio onde o Senhor torne a encarnar-se, uma imagem da gruta de Belém e uma imagem da Virgem Maria. Deve ser um abrigo de solidão e silêncio, onde a nossa alma se reserve inteiramente para Deus e o convide a realizar a sua obra mais valiosa, que é a de comunicar-nos a sua alegria.

A primeira falta que podemos cometer contra a solidão é estarmos demasiado presos ao mundo e à família no seio da qual nascemos. Evidentemente, não se trata de tirar nada do amor que sentimos pelos nossos pais e pelos parentes próximos; pelo contrário, temos a obrigação de amá-los cada vez com um amor mais puro . E se eles estiverem em dificuldades ou necessitados, é justo que soframos por isso. Mas é necessário saber confiá-los a Deus e, se sofremos, sofrer com confiança e abandono perfeitos, de modo que esse sofrimento nos una ainda mais a Deus.

Outra falta contra o espírito de solidão, que tem também a aparência de uma boa intenção, é meter-nos onde não somos chamados: por exemplo, fazendo da ajuda que devemos prestar solicitamente às pessoas chegadas a nós, ocasião para inúteis comentários e falatórios com terceiros, sem guardar a devida discrição. Se acima de tudo soubermos permanecer unidos ao Senhor e confiar-lhe as nossas preocupações com os familiares e os próximos, a doce chama da caridade espalhar-se-á entre os que necessitam da nossa ajuda e contribuirá para manter neles e em nós uma atmosfera de paz que a todos nos consola, nos santifica e nos prepara para o céu.

Ainda outro obstáculo é infelizmente a tagarelice interior, que nos faz muito mal. Em vez de pensarmos na divina realidade do amor, que nos convida a vivê-lo no momento presente, pensamos em coisas irreais, no passado, no que poderíamos fazer no mundo, em acontecimentos que, aliás, não está em nossas mãos controlar. Ou então deixamos desenvolverem-se em nós pensamentos de crítica contra as pessoas das nossas relações ou queixamo-nos interiormente daquilo que temos de sofrer.

Bem sei que o silêncio interior não é fácil e que é sempre imperfeito. Mas é necessário que nos esforcemos com paciência por preservá-lo. O nosso coração é indiscreto e é ele que nos trai. Façamo-lo calar, e o demônio deixará de encontrar-nos, e as tentações deixarão de fazer-nos mossa.

Estes esforços por conservar a solidão e o recolhimento não têm por fim apenas assegurar-nos a calma e o equilíbrio. Trata-se de cooperar com o supremo desejo que Deus quer ver realizado na nossa alma, dando nela um refúgio onde o seu Filho possa voltar a nascer. Por mais humilde e oculta que seja a nossa existência, o amor que reina no nosso coração é um bem para a humanidade. Porque esta tem necessidade de caridade. Só a caridade é que dá alegrias; e, por outro lado, a graça é fecunda: não pode arder em nós sem dar origem a muitos outros focos de incêndios de amor.

Que a Virgem Maria, escondida e silenciosa na gruta de Belém, nos ajude a imitá-la no recolhimento e na pureza, na sua fidelidade de esposa e na sua generosidade de Mãe das almas.


Fonte: A vida em Deus, Quadrante, 2012.

Tradução: Emérico da Gama 
Créditos: Quadrante

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